Musk, o índice de idiotice, estilo Startup e Lean
Ao ler a biografia de Elon Musk de Walter Isaacson ficamos com a impressão de uma pessoa bastante questionável. Por outro lado, percebe-se a presença de um gênio com uma mentalidade apurada de melhoria de processos.
Aos 46 anos, Elon Musk já inovou e construiu empresas revolucionárias multibilionárias em áreas bem diferentes: Paypal (Serviços Financeiros), Tesla Motors (Automotivo), SpaceX (Aeroespacial) e a recente startup de implante cerebral Neuralink.
O Musk usa o pensamento dos princípios básicos como uma estratégia eficaz para resolver problemas complexos e gerar soluções originais. Em 2002, Musk iniciou sua busca para enviar um foguete a Marte. Desafio: o custo de aquisição de um foguete era astronômico – até US$ 65 milhões. Começou a repensar o problema: “A física ensina a raciocinar a partir dos princípios básicos. Do que é feito um foguete? Ligas de alumínio, um pouco de titânio, cobre e fibra de carbono. Qual é o valor desses materiais no mercado de commodities? Cerca de 2% do preço total.”
Em vez de comprar um foguete pronto por dezenas de milhões, Musk decidiu criar sua própria empresa, comprar matérias-primas baratas e construir os foguetes. Nasceu a SpaceX. O foguete da SpaceX é 10 vezes mais barato e com custo 30-100 vezes menor do que a NASA no transporte de carga útil para o espaço. Usualmente pensamos por analogia ao invés de pensar nos princípios básicos. Nos inspiramos em um processo já existente (benckmarking) e o modificamos – em geral, levemente. Tendemos a otimizar a forma ao invés da função. Um exemplo interessante disto é a mala com rodinhas. Na Roma antiga (uns 2.000 anos atrás) os soldados usavam bolsas de couro para transportar comida enquanto cavalgavam. Tinham também veículos com rodas, como bigas e carroças. Durante milhares de anos, ninguém pensou em combinar a bolsa e a roda.
Enquanto todos estavam focados em como construir uma sacola melhor (forma), Bernard Sadow considerou como armazenar e movimentar as coisas de maneira mais eficiente (função).
Temos exemplos da aplicação do pensamento pelos princípios fundamentais nas empresas de Elon Musk? Há vários!
- Musk perguntou a sua equipe por que custaria US$2 milhões para construir guindastes que levantassem o Falcon 9. Motivo: exigências obsoletas da Força Aérea. Os guindastes acabaram custando US$300.000.
- A válvula de um foguete custava mais de 30 vezes o preço de uma válvula parecida em um carro.
- As travas usadas pela NASA na estação espacial custavam US$1.500 cada. Um engenheiro da SpaceX modificou uma trava de porta de banheiro ao custo de US$30.
- O sistema de resfriamento de ar para o compartimento de carga útil da Falcon 9 ia custar US$3 milhões. Compraram algumas unidades de ar-condicionado comum (ao custo de US$6.000/cada) e modificaram as bombas para que funcionassem no topo do foguete.
- O complexo de lançamento construído pela Lockheed-Boeing para o foguete Delta IV custou 10 vezes mais do que um parecido construído para o Falcon 9.
Melhoria por analogia e melhoria pelos princípios fundamentais
Considere a seguinte melhoria feita em um processo de compras. O mapa do processo antes das melhorias mostrou 316 caixinhas (atividades).
Após melhorias (pensamento x analogia) foram eliminadas 70 caixinhas. Parece uma redução interessante… mas por outro lado, ainda ficaram 246 caixinhas!
Ao pensar nos princípios básicos o raciocínio seria: “quais são as funções básicas de um processo de compras?”. Poderíamos pensar por exemplo nas funções da figura abaixo (6 caixinhas). O próximo passo seria raciocinar como estruturar esse processo da forma mais simples possível!
O índice de idiotice de Musk e a eficiência do processo do Lean
Quando os engenheiros da SpaceX do Musk estavam desenvolvendo o foguete Starship calcularam que seriam necessários cerca de 40 motores raptor para impulsionar o foguete. Fazer isso era complexo e caro demais na visão de Musk (US$ 2 milhões). Precisaria reduzir seu custo a US$ 200.000.
Musk criou o índice de idiotice:
Se o índice de idiotice é alto – exemplo, um componente que custa US$1.000 quando o alumínio usado em sua fabricação custa apenas 100 – tem alta probabilidade de ter um design complexo demais ou um processo de manufatura ineficiente. Se a proporção é alta, você é um idiota.
Olharam as vinte piores peças pelo índice de idiotice. Eram as partes que precisavam de maquinário de alta precisão, como bombas e carenagem. Investigaram técnicas usadas pelas fábricas de automóveis para manter custos baixos.
Musk tomou a decisão de minimizar o uso de ligas caras. Houve resistências. Acabaram conseguindo trocar a matéria-prima da maior parte das peças para aço inoxidável. Em alguns casos houve redução de custos de 90%.
A maior mudança feita foi colocar engenheiros de projetos no comando da produção. Se o design custa caro para produzir, mude o design! O objetivo principal era fazer um motor reduzido às características mais essenciais. Musk colocou em um e-mail: nada é sagrado. Todo tubo, sensor, peça, etc. levemente questionável foram eliminados. No fim chegaram a um mapa para reduzir: De US$2.000.000 -> US$200.000
No Lean, a eficiência do processo leva em conta o tempo total de duração da atividade e o tempo agregador de valor para o cliente:
O inverso da eficiência de um processo pode ser pensado como um equivalente ao índice de idiotice de Musk:
Exemplo, um processo com Eficiência igual a 1% (ou seja, o tempo VA é 1% do tempo total) tem um índice “Vê se acorda!” de 100. Uma tarefa que poderia ser feita – por exemplo – em 1 minuto, está levando 100 minutos para ser concluída. Tem algo muito errado nisso. O processo precisa ser revisto!
Estilo Startup para reduzir o tempo dos projetos
Finalmente um ponto importante é o teste rápido das ideias, conforme o estilo startup de Eric Ries. Em muitos projetos do tipo melhoria (D-MAI-C estilo startup®) ou desenvolvimento (D-MAD-V) os times gastam tempo demais analisando dados antes de propor e testar soluções do tipo MVP (minimum viable product).
Uma estratégia que estamos implementando é após a etapa Definir, ao entrar no ciclo estilo startup MAI (ou MAD no DFLSS) realizar um evento criativo do tipo Design Sprint do Google. Em 3-5 dias a equipe sai com uma ideia criativa para testar. A seguir são feitas correções após o teste da ideia.
Musk adotou uma abordagem iterativa no design. Foguetes e motores seriam rapidamente prototipados, testados, explodidos, revisados e testados novamente, até que, por fim, algo funcionasse. Mova-se rápido, exploda coisas, repita. “Não se trata de evitar problemas”. “O que importa é a velocidade com que você descobre qual é o problema e o conserta.”
Conclusões
Os projetos Lean Six Sigma podem se beneficiar enormemente se aproveitamos conceitos que foram e são usados amplamente por diversas empresas inovadoras. Algumas dicas:
- Comece a mudar o pensamento pela analogia pelo pensamento pelos princípios básicos, ou seja, pense qual é a função básica do processo ou produto que está criando ou melhorando.
- Use as diversas ferramentas do Lean para reduzir ao máximo a complexidade dos processos.
- O índice “Vê se Acorda!” pode ser usado para compreender o espaço que há ainda disponível para aumentar a eficiência dos processos.
- Não perca tempo com estudos infinitos, use o estilo startup para fazer testes rápidos da solução. Se o teste foi um desastre, ótimo, aprendemos rapidamente que há coisas que não funcionam. Se o teste foi bom, ótimo, melhoremos ainda mais a solução e iniciemos sua implementação.
Bibliografia
- Graupp, Patrick and Wrona, Robert J. (2016). The TWI Workbook. 2. ed. CRC Press.
- Eric Ries (2019). O estilo startup: Como as empresas modernas usam o empreendedorismo para transformar sua cultura e impulsionar seu crescimento. Editora Sextante.
- Walter Isaacson (2023) Elon Musk. Editora Intrínseca.
- Jake Knapp, John Zeratsky e Braden Kowitz (2017). Sprint: O método usado no Google para testar e aplicar novas ideias em apenas cinco dias. Editora Intrínseca.
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