A soja, o Seis Sigma e os Planos de Inspeção
A soja, o Seis Sigma e os Planos de Inspeção – Em inspeção por amostragem às vezes tem absurdos com os quais o nosso amigo Black Belt “Histo DOE” tem que conviver. Veja o artigo abaixo, o qual pode ser consultado no link http://revistagloborural.globo.com/GloboRural/0,6993,EEC729428-1485,00.html. Este artigo gerou uma discussão entre Histo DOE e um técnico de nome Nasco.
A discussão…
Histo DOE – “Mas você viu que absurdo! Há produtores que estão mencionando que essa é uma prática comum. Que se aceita certa porcentagem de contaminação e essa é uma forma de “desovar” a soja utilizada como semente (que é tratada com agrotóxico)…”
Nasco – “Meu amigo Histo DOE, vou tentar explicar de forma simples como funciona a teoria de planos de aceitação por amostragem. Neste tipo de esquemas, o consumidor pode desejar um plano de amostragem que garanta que não vai aceitar, mais do que 10% das vezes, material que tem 3% de defeitos ou mais. Ele também quer que seu fornecedor fabrique um produto com um nível de defeitos menor que 1% e nesse caso, deseja que o produtor utilize um plano de amostragem que aceite esse produto pelo menos 95% das vezes. Você entendeu? Neste caso dizemos que o risco do produtor é 5% e o risco do consumidor é 10%.”
Histo DOE – “Você me faz lembrar uma historinha que diz mais o menos o seguinte: um produtor ocidental estava procurando um fornecedor de seringas hospitalares no Japão. Viu que aparentemente a qualidade era muito boa, mas por precaução ele pediu para o japonês: tudo bem, gostei do que vi, mas eu quero que você me garanta que o lote tenha 1% de defeitos ou menos, com 99% de confiança. O japonês respondeu: aí o preço não pode ser mais o combinado! Por que? questionou o ocidental. Porque vou ter que deslocar uma pessoa para que fique martelando 1% das seringas para que fiquem com defeito!
A conclusão…
- No artigo do Valor Econômico (“Navio com soja contaminada terá que voltar”) se pode ler: “…no mercado internacional, admite-se um grau de contaminação de 0,2%…” O que isso significa? Que podemos contaminar a soja para que um produto Seis Sigma se converta em outro 2,9 sigma? Alude-se que o índice encontrado na carga de soja embarcada estava em 0,06% (3,2 sigma). Isso é bom para um alimento?
- Veja no artigo do Estado (10/6/2014) “Chineses voltam a reclamar de soja brasileira” a nova promessa para o cliente: processo de 3,5 Sigma!
- Finalmente no artigo da Investnews (“Veto à soja pode prejudicar saldo da balança”) encontra-se o motivo da contaminação… e os desgastes comerciais por trabalhar com padrões de qualidade inferiores aos desejados pelo cliente…
O Experimento de Histo DOE
Histo DOE ficou curioso com o artigo sobre a soja e foi ao supermercado e comprou 3 pacotes de soja de 1 kg. Passou em uma farmácia de manipulação e pediu para pesar um grão de soja = 0,2g. Logo, 1kg 5.000 grãos. Chegando em casa contou a quantidade de grãos contaminados em cada quilo (o grão fica com aparência de cor roxa), exatamente igual ao mostrado pelo ministro da agricultura na TV. Encontrou nas amostras 8 grãos contaminados em média (2,9 Sigma). O ministro disse em entrevista que foi acordado com os Chineses (um grão contaminado por quilo), isto é, passou de 3,2 sigma para 3,5 sigma. O processo 6 sigma seria 1 grão contaminado a cada 58,82 Kg.
Navio com soja contaminada terá que voltar
Valor Econômico, 17/05/2004
PORTO ALEGRE, BRASÍLIA e SÃO PAULO – Corria na manhã de sexta-feira (14/05), em Brasília, uma reunião entre o Secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Maçao Tadano, e empresas exportadoras de soja envolvidas com um carregamento de produto brasileiro barrado na China por estar contaminado com fungicida, quando veio a notícia de que outro navio suspeito havia deixado o porto de Rio Grande (RS) com o mesmo destino. E, neste caso, sem certificação do ministério, que havia constatado a presença de sementes na carga de 59 mil toneladas – e normalmente são as sementes que podem estar contaminadas. Terminada a reunião, Tadano mostrou-se irritado com o novo caso.
“O governo vai às últimas consequências. Se for preciso cancelar [o registro de] empresa de exportação, nós faremos”. Em seguida, o ministério emitiu um aviso às autoridades portuárias da China e dos países que mantêm relações comerciais com o Brasil sobre a situação do navio. Sem a certificação, ele não poderia descarregar em nenhum porto do planeta. O stress durou até o fim da tarde, quando a administração de Rio Grande fez contato com o navio Bunga Saga 10 e ordenou sua volta. Segundo o delegado federal do Ministério da Agricultura no Rio Grande do Sul, Francisco Signor, a carga seria vistoriada para, em seguida, ser enviada a outro país ou descarregada. “Nossa vontade é usar essa soja como biodiesel, e não vender para outro lugar, porque ela foge à legislação do Brasil e às normas internacionais para comercialização do grão para alimentação humana ou animal”.
O Bunga Saga 10 partiu do terminal da Bianchini S.A. em Rio Grande. Representante da empresa também participou da reunião com Maçao Tadano, já que é uma das envolvidas – com Cargill Agrícola, Irmãos Trevisan e Noble Grain, com sede em Hong Kong – com a carga contaminada que motivou o encontro. Esta partiu também de Rio Grande, em 12 de março, mas não pôde descarregar no porto de Xiamen por estar contaminada.
Na reunião, as empresas disseram não ter como controlar a qualidade da soja que compram dos produtores, principalmente nos níveis de exigência adotados pelos chineses. Um analista lembra que, no mercado internacional, admite-se um grau de contaminação de 0,2%, e que a carga em questão apresentava índice de 0,06%. Para as empresas, a mistura de grãos com sementes pode ter sido feita pelos produtores. E reclamaram da precária fiscalização no recebimento das cargas nos portos. Nesse sentido, Signor disse que, a agora, a fiscalização gaúcha exigirá laudo prévio, emitido por laboratório credenciado, de todas as cargas de soja para exportação.
Em nome das empresas, Sérgio Mendes, diretor-geral da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), disse que o país poderá perder divisas caso a China mantenha proibida a entrada de soja embarcada por Cargill, Trevisan e Bianchini. E disse que elas estão preparando uma defesa para ser apresentada à China. Sem ajuda do governo.
Chineses voltam a reclamar de soja brasileira
Fabíola Salvador, Patrícia Campos Mello e Renato Cruz, com Reute
Estado de São Paulo, 10/6/2004
São Paulo – Um dia depois de o brasileiro ter definido regras rígidas para o embarque de soja, a China, maior cliente do País para o produto, voltou a encontrar problemas de contaminação em pelo menos dois embarques do Brasil. Segundo estimativas da iniciativa privada, o embargo da China e a queda dos preços da soja no mercado internacional resultaram em prejuízo de US$ 1 bilhão ao País.
Desde o mês passado, a China já suspendeu a compra de soja brasileira proveniente de oito empresas – Noble Grain, Cargill, Irmãos Trevisan, Bianchini, ADM, Louis Dreifus, Cargill Internacional e Libero Trading – e devolveu 239 mil toneladas de grãos brasileiros, por estarem misturados sementes a tratadas com agrotóxico.
Hoje, funcionários do porto e fiscais sanitários das cidades de Xiamen e Qinhuangdao informaram que ainda não foi decidido se os grãos serão devolvidos. Porém, de acordo com as autoridades de Xiamen, é provável que sim. Segundo fontes de mercado, os carregamentos seriam Chinatex, uma trading chinesa, e haveria um terceiro navio sob suspeita.
Regras mais rígidas
Ontem, o Ministério da Agricultura anunciou que só será permitido o embarque de soja em que a análise visual detectar até uma semente tratada por fungicida por quilo de grãos. “Se o número de amostras em função do volume do lote for de 10 quilos, então para esses 10 quilos serão tolerados 10 grãos”, explicou o ministro Roberto Rodrigues.
A avaliação do mercado é de que a medida pode ser demais para as empresas e de menos para a China. Os Estados Unidos, por exemplo, permitem três sementes com fungicida para um quilo de grãos. Os importadores chineses, por outro lado, exigem que a soja não tenha uma semente sequer. “O custo vai aumentar, o que pode restringir a exportação”, afirmou o vice-presidente da Caramuru Alimentos, César Borges de Sousa. “Acho desnecessário conceder mais que os EUA.”
De acordo com Sousa, da Caramuru, convém avaliar se ainda compensa atender à China. “Não podemos ficar escravos de exigências descabidas.” A empresa não exporta para o mercado chinês. O principal destino de sua soja é a Europa. O executivo disse que a situação chinesa causa grande incerteza: “Quem vendeu, não sabe se desembarcará e quem desembarcou não sabe se vai receber.” O governo chinês cortou o crédito de processadores de soja, que buscam cancelar importações.
Veto à soja pode prejudicar saldo da balança
Investnews, 02/06/2004
São Paulo, 2 de Junho de 2004 – O Brasil poderá deixar de exportar 2 milhões de toneladas de soja para a China, o equivalente a US$ 500 milhões, caso seja mantido o embargo chinês às exportações brasileiras em razão da contaminação por sementes – as sementes são tratadas com um fungicida considerado impróprio para consumo humano e animal. A manutenção do embargo poderá impactar a balança comercial brasileira, já que o complexo soja é o principal item da pauta de exportações, com receitas projetadas em US$ 10,5 bilhões.
“Se não embarcarmos as duas milhões de toneladas, isso será um verdadeiro desastre não só para os exportadores, mas para toda a cadeia produtiva”, diz Sérgio Mendes, presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec). Hoje pela manhã representantes dos exportadores e da indústria vão se reunir para analisar medidas propostas pelo governo brasileiro para tentar chegar a um acordo com a China.
Um dos assuntos em pauta é o índice de contaminação das cargas. Enquanto o governo brasileiro caminha para uma proposta de “contaminação zero” – a exemplo do que pede a China – os exportadores propõem o modelo norte-americano, de até 3 sementes por quilo de soja. “Estamos prontos a aceitar uma contaminação inferior a 3 sementes por quilo, mas a tolerância zero é impossível”, afirma.
Sementes e transgênicos
Com a Medida Provisória que autorizou o plantio de soja transgênica em 2003/04, muitos produtores teriam substituído sementes convencionais pelas geneticamente modificadas criando, desta forma, um excedente de sementes que não foram aproveitadas.
De acordo com as normas brasileiras, as sementes que não são aproveitadas numa safra devem ser incineradas. Porém com os elevados preços da soja, os produtores teriam misturado as sementes ao grão que entregaram após a colheita.
As sementes – quando tratadas com fungicidas -, são facilmente reconhecíveis a olho nu em razão da coloração avermelhada, em contraste com a cor amarela da soja. Mendes diz que o embargo chinês às cargas brasileiras “curiosamente” ocorreu em um momento em que os preços desabaram. Ele informa que os chineses compraram a um preço médio de US$ 300 por tonelada.
Após a previsão de uma supersafra norte-americana, os preços caíram para US$ 240, uma desvalorização de 20%. “Para um navio de 60 mil toneladas, é a diferença entre pagar US$ 18 milhões ou US$ 14,4 milhões pela carga”, diz Mendes.
Hoje, Brasil e Argentina são os únicos grandes fornecedores de soja no mercado internacional. Os Estados Unidos, maiores produtores mundiais, estão na fase de plantio da safra 2004/05.
Chicago em alta No mercado internacional, as cotações da soja fecharam no limite de alta na bolsa de Chicago. Chuvas nas áreas produtoras dos Estados Unidos e a ameaça de replantio provocaram alta de 6,5% no dia. Os contratos para agosto foram negociados a 825 centavos de dólar o bushel, ou US$ 18,18 a saca de 60 quilos.
“A área que será replantada representa uma porcentagem ínfima do total”, diz Renato Sayeg, da Tetras Corretora. “Mas o medo de que algo possa dar errado é tão grande que nem mesmo o baixo volume de registros de exportações norte-americanas foi capaz de deter a escalada de preços”, afirma. O governo dos EUA informou que os registros foram de 46 mil toneladas na semana passada, para uma expectativa inicial de cerca de 140 mil toneladas.
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