ANVISA, precisão e Resolução RE 899
A falta de conceitos de pensamento estatístico pode conduzir a absurdos como o requerimento da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) relacionado à precisão de um método analítico que menciona no item 2.4.3: “A precisão pode ser expressa como desvio padrão relativo (DPR) ou coeficiente de variação (CV%), segundo a fórmula, DPR = CV% = S/média x 100, onde, S é o desvio padrão. O valor máximo aceitável deve ser definido de acordo com a metodologia empregada, a concentração do analito na amostra, o tipo de matriz e a finalidade do método, não se admitindo valores superiores a 5%.”
Precisão de um método analítico
Os conceitos que deveriam ficar claros antes de avaliar para avaliar a precisão de um sistema de medição são:
A variação de um sistema controlado (neste caso do sistema de medição) pode ser avaliada pelo desvio padrão, S. Quanto menor o desvio padrão, melhor o sistema de medição. O desvio padrão pode ser interpretado como um desvio médio e não como a variação máxima da medição:
Se medirmos repetidamente a mesma amostra e determinamos, por exemplo, o teor de princípio ativo de um medicamento, quase todas as medições irão se encontrar no intervalo: média-3S e média+3S (Figura 1). Diz-se que a o caminho da medição tem largura igual a 6S e não igual a 1S. Se uma medição tem S = 5, as medições no longo prazo apresentarão uma largura de variação igual a 30 (6 x 5).
Figura 1 – Variação de um sistema de medição com desvio padrão = S
A precisão de um método deveria ser avaliada pelo menos em relação à largura da especificação que o método pretende controlar (Figura 2).
Figura 2 – A precisão da medição deve se relacionar com a largura da especificação
Recomendação da ANVISA para avaliar um sistema de medição
Voltando ao caso da ANVISA, o item 2.4.3 da Resolução nº 899 expressa: “Reprodutibilidade (precisão inter-laboratorial): concordância entre os resultados obtidos em laboratórios diferentes como em estudos colaborativos, geralmente aplicados à padronização de metodologia analítica, por exemplo, para inclusão de metodologia em farmacopéias. Estes dados não precisam ser apresentados para a concessão de registro. A precisão de um método analítico pode ser expressa como o desvio padrão ou desvio padrão relativo (coeficiente de variação) de uma série de medidas. A precisão pode ser expressa como desvio padrão relativo (DPR) ou coeficiente de variação (CV%), segundo a fórmula, DPR = RSD = CV% = S/média x 100, em que, S é o desvio padrão e média, a concentração média determinada. O valor máximo aceitável deve ser definido de acordo com a metodologia empregada, a concentração do analito na amostra, o tipo de matriz e a finalidade do método, não se admitindo valores superiores a 5%”.
Veremos a seguir que esta forma de avaliar a precisão é um absurdo. Consideremos a situação em estejamos medindo o teor de um comprimido e que a especificação tem um alvo = 100% e limites de especificação variando entre 90% a 110%. Neste caso um sistema de medição com RSD = 5%, terá também um desvio padrão = 5%. Na Figura 3 ilustramos 500 medições deste sistema de medição. Observa-se que só a medição tem variação que supera a largura da especificação! Claramente esta situação é inaceitável.
Figura 3 – Sistema de medição com variação que atende aos critérios da ANVISA (RSD = 5%). Somente a variação da medição (sem variação da amostra) gera resultados fora da especificação!
Considere outra situação em que a empresa utiliza um critério mais restritivo do que a ANVISA e decide utilizar RSD = S = 2% para a mesma especificação (Figura 4).
Figura 4 – Sistema de medição com variação que atende aos critérios da ANVISA (RSD = 2%). Somente a variação da medição (sem variação da amostra) gera resultados que ocupam 60% da especificação!
O que fazer? Métrica P/T para cálculo da qualidade da medição
Um critério muito utilizado atualmente determina que para que um sistema de medição seja considerado aceitável o quociente:
deveria ser menor que 30%. O sistema da Figura 3 seria claramente insatisfatório, assim como o da Figura 4:
Figura 3 P/T = 100 (6 x 5)/20 = 150% (> 30%, inadequado)
Figura 4 P/T = 100 (6 x 2)/20 = 60% (> 30%, inadequado)
Recomendação da MID
O Minitab apresenta o procedimento para determinação do índice P/T e sua aplicação está ilustrada em dois artigos que estão no site:
Estudos RR Parte I – Planejamento
Para validar a medição é essencial realizar medidas repetidas de uma ou mais amostras. A escolha do número de repetições pode ser realizada usando o CV do desvio padrão da repetibilidade.
Estudos RR Parte II – Análise dos Dados
Há ferramentas para análise dos sistemas de medição para dados balanceados ou desbalanceados. A correta interpretação dos dados facilita a melhoria do sistema de medição ao mostrar quais são os fatores mais influentes.
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